sábado, 29 de outubro de 2011
Documentário dobre a suposta "Desmobilização" do grupo Paramilitar Bloque Cacique Nutibara
O Bloque Cacique Nutibara é o grupo Paramilitar que coordenou com a polícia e o exército a ocupação da Comuna 13, na Operação Orion
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
Entrevista com Iván Dario Ramirez sobre o "Modelo de Medellín"
http://www.comunidadesegura.org/pt-br/MATERIA-medelin-o-desafio-continua
Andrea Domínguez 28/06/2011 - 03:00
Andrea Domínguez 28/06/2011 - 03:00
ENTREVISTA / Iván Darío Ramírez
Depois de ter registado uma taxa de homicídios de 381 por 100 mil habitantes em 1991 - três vezes o registrado atualmente em Ciudad Juarez, uma das cidades mais violentas do mundo hoje, de acordo com o Institute for International Studies, da Universidade de Stanford -, Medelin conseguiu reverter a situação dramática e, em 2004, alconçou uma taxa de 24 homicídios por 100 mil habitantes, deixando para trás cidades como Washington. Os dados da cidade colombiana são da ONG Medelln como Vamos e do Instituto de Medicina Legal da Colômbia.
As bibliotecas de bairros de baixa renda, os teleféricos interligando as comunidades por cabo e o investimento em cultura, recreação e esporte se tornaram ícones do "Modelo de Medelin". Mas um aumento nas taxas de violência nos últimos anos, como o assassinato a tiros de 80 crianças só neste ano e uma taxa de homicídios de 45 por 100 mil habitantes em 2010 - reacendeu os temores de que a violência volte aos níveis do passado.
O sociólogo Ivan Ramirez, coordenador do Observatório de Crianças em Conflitos Armados e em Violência Armada Organizada, da organização Paz e Democracia, fala sobre os sucessos e fracassos do "Modelo de Medellin", introduzido pelos prefeitos Sergio Fajardo e Alonso Salazar e chama a atenção para a importância de reforçar o investimento social para evitar retrocessos na cidade industrial no oeste da Colômbia.
Muito se fala sobre o sucesso do “Modelo de Medelin”, mas agora fala-se em retrocesso em termos de segurança. Como está Medellin hoje?
Deve-se dividir a história de Medelin entre antes e depois do Projeto Compromisso Cidadão, iniciado na administração do prefeito Sergio Fajardo e que continua até hoje, com Alonso Salazar. O projeto procura dar mais transparência aos recursos e direcioná-los um pouco mais para a ação social.
Na minha opinião, esta estratégia foi baseada no fato de que a cidade - e não apenas por razões de segurança, mas pelo seu modelo administrativo - era desprovida de condições que poderiam torná-la competitiva internacionalmente. A ideia dessas duas administrações era melhorar alguns indicadores e o investimento social era um meio de fazê-lo. Devemos reconhecer que houve uma ruptura com os modelos anteriores e uma maior preocupação com os direitos dos indivíduos.
Que aspectos específicos dessa mudança são vistos hoje como um modelo?
Há uma melhora na qualidade de vida em diversos aspectos, como infraestrutura, transportes, educação, creches, bibliotecas e atividades recreativas e culturais. Basta ir aos bairros e ver as obras e atividades. Todos os atores reconhecem que há progresso no investimento em projetos culturais - ainda não o suficiente, mas melhor do que antes.
Mas a cidade está mais ou menos segura?
Essa questão tem sido controversa o tempo todo. O Compromisso Cidadão do governo local coincidiu com a primeira desmobilização de grupos paramilitares. Indiscutivelmente, o prefeito de Medelin fez uma aposta ao investir recursos humanos e financeiros num processo de reintegração social.
Posso concordar com as críticas de que o governo federal deixou o projeto sozinho, sem um acompanhamento de supervisão e monitoramento local sério o suficiente para entender que esse processo de Compromisso Cidadão também deveria servir aos setores que vieram do tráfico de drogas e a paramilitares desmobilizados e suas associações com a violência armada organizada.
Quais são os argumentos de ambos os lados?
Há os que argumentam que os melhores níveis de segurança e de taxas de homicídio que ocorreram principalmente na primeira administração foram resultado da política de reintegração. Mas existe outra visão que diz que houve uma espécie de pacto, tácito ou não, onde, após a desmobilização, os grupos armados determinaram que se estabelecesse um controle porque isso os favorecia naquele momento, já que não iriam persegui-los.
Setores da oposição e defensores de direitos humanos reclamam que o processo de desmobilização teve muitos enganos. No processo de reintegração, grupos armados ilegais aproveitaram o mecanismo e entraram em um jogo que lhes permitiu recriar algumas de suas próprias estruturas. Pesquisadores e críticos queixaram-se que há agora um poder "gangster" ou "ilegal" na cidade, que não só tem a ver com o crime de tráfico de drogas, mas de crime interessado no estado. Os números mostram que em 2008 os homicídios caíram para 30 por 100 mil habitantes e hoje temos cerca de 100 por 100 mil.
E onde o programa falhou?
Agora a experiência mostra que a cidade errou ao não reconhecer a magnitude e a complexidade do problema. Havia paramilitares que se desmobilizaram mas não se desarmaram e paramilitares que se desarmaram mas não se desmobilizaram, isto é, indivíduos e grupos que exerciam um controle temerário em muitos bairros. Um grupo muito importante de ex-rebeldes voltou a armar-se. Além disso, grupos criminosos e civis que nunca participaram desses grupos se juntaram para obter os benefícios da desmobilização.
Pode-se afirmar, então, que a melhora nos níveis de segurança se deveu a um pacto tácito de não-agressão?
Analistas do fenômeno urbano em Medelin concordam que este foi um fator importante e a prova é que temos hoje na cidade um grupo que pode ser chamado de neo-paramilitares, que aprendeu com a experiência dos paramilitares. Para alguns, antes havia paramilitares com táticas criminosas e agora há criminosos com táticas paramilitares.
Organizações da sociedade civil concordam que há uma mistura entre uma concepção e práticas criminosas associadas com paramilitares. Falar de associação é complexo, mas podemos notar que houve tolerância e não houve uma leitura e ações mais efetivas frente ao problema. Por exemplo, as denúncias de ameaças a líderes sociais e de direitos humanos por parte de desmobilizados, incluindo o assassinato de alguns deles. Mas o fato mais evidente é a existência de um controle territorial que não deixou de existir e que se expressa sob novas formas.
Como isso se manifesta na cidade?
Existem estruturas que chamamos de violência armada organizada que não necessariamente têm interesse no projeto de contrainsurgência, mas sim um interesse fundamentalmente econômico, que recorrem a grupos paramilitares e tentam captar o impacto sobre o estado.
Não são apenas ligadas ao tráfico de drogas, mas também a outras economias ilícitas, como o controle territorial, e com uma concepção clara de ataque a defensores dos direitos humanos e líderes sociais, como as organizações das vítimas. O recrutamento amplo de crianças e adolescentes a esses grupos armados também fizeram aumentar as taxas de homicídio nos últimos dois anos.
Quem são os grupos que agora ameaçam a segurança de Medelin?
São grupos que se reorganizaram durante processos anteriores e que começam uma nova disputa sobre o território e o mercado interno. No entanto, a cidade tem dificuldade em definir ou aceitar a existência desses grupos armados, que são novas expressões de estruturas paramilitares.
E como eles se organizam?
Segundo alguns pesquisadores, estas estruturas têm um projeto econômico, um interesse no Estado e buscam o controle territorial por meio do controle das organizações de defesa dos direitos humanos e por meio de ações criminosas, não só no tráfico de drogas, mas em ações de corrupção, extorsão e intimidação.
Por outro lado, o governo insiste que são estruturas criminosas e não têm interesse em controlar territórios. Acreditamos que esses setores têm interesse em capturar o Estado, como a máfia em cidades na Itália e em outros lugares.
Como se identifica a disputa por território entre esses grupos?
Eles usam cada vez mais crianças nas práticas criminosas, recrutando-as para o transporte de drogas e a exploração sexual. Hoje, muitas escolas em Medelin são territórios disputados por grupos armados e estão permeadas por seus interesses criminosos.
Eles estão dentro das escolas?
Na Colômbia, além da violência política, as escolas vivem sob o controle de grupos armados com interesses econômicos que se expressam na venda de drogas, no uso de meninas para exploração sexual e na circulação de armas.
O poder armado também é usado para pressionar as autoridades da escola. Diretores atuam com medo, professores são ameaçados, crianças estão amedrontadas e isso tem um impacto forte na desescolarização. Há um caso que ilustra a gravidade do problema: uma escola em que dos 450 estudantes se evadiram, 75 o fizeram devido a ameaças ou porque não podem passar a fronteira entre um território e outro.
Que figuras ilustram a vitimização de crianças e jovens em Medelin?
Em 2000, quando a taxa de homicídios foi de 167 por 100 mil habitantes, a cada 4,8 dias uma criança foi assassinada. Em 2009, a cada três dias matou-se uma criança na cidade. Em 2010, a cada 1,8 dias, uma criança foi morta, e em fevereiro de 2011, quase todo dia uma criança morreu a tiros na cidade.
Entre janeiro e fevereiro de 2011, 58 menores de 18 anos foram mortos, segundo o Instituto Nacional de Medicina Legal. Nos últimos 18 meses, mataram cinco jovens artistas do hip hop de grupos da Comuna 13. Precisamos acordar. Se não dói uma criança morrer a cada dia aqui, então o que dói?
Foto: Iván Ramírez
Tradução: Marina Lemle
Violencia en las comunas de Medellín: No futuro
http://www.lasillavacia.com/historia/17593
Por: Dora Montero Carvajal, 25 de agosto, 2010 3:23 pm
Por: Dora Montero Carvajal, 25 de agosto, 2010 3:23 pm
Violencia en las comunas de Medellín: No futuro
En las comunas de Medellín, las bandas se enfrentan entre ellas con armas de largo alcance, atacan las viviendas y además imponen sus reglas.
Medellín atraviesa por una crisis humanitaria. En palabras de la personera delegada para los Derechos Humanos de la Personería de Medellín, Ana Patricia Aristizábal, lo que se vive en varias de sus comunas, especialmente en la 13, con el desplazamiento, los enfrentamientos armados, los asesinatos y las amenazas retrata ese panorama.
Las alertas fueron activadas por la Personería, con un informe donde se da cuenta del aumento del 20 por ciento en los homicidios de la ciudad (1.057 entre enero y junio), todo por una guerra sin cuartel que libran bandas de hombres con armas de largo alcance y que obligan a los habitantes de estas zonas a vivir bajo sus leyes y escondidos. Esa zozobra está en el día a día de quienes viven en por lo menos 52 sectores de la ciudad. (Ver mapa de los enfrentamientos por comunas, elaborado por la Corporación Convivamos)
Las bandas se enfrentan por el control del territorio y de los sitios de distribución de drogas, y obedecen, según las autoridades, a jefes de organizaciones narcotraficantes conformadas por antiguos paramilitares.
No son pequeños grupos. El Comandante de la Policía de Medellín dice que hay 123 estructuras criminales identificadas que agrupan a 3.600 hombres.
Pero no solo se enfrentan entre ellos. Por el dominio territorial afectan a los civiles y prueba de ello es la deserción escolar, que según la Personería alcanza los 938 estudiantes habían abandonado sus colegios por evitar las represalias originadas en los límites territoriales impuestos por los grupos armados en los barrios, las amenazas y los señalamientos de ser integrantes de algunas de la estructuras en disputa.
También la cifra de niños asesinados, pues según el informe, entre enero y junio sumaron 103, pero además las organizaciones de Derechos Humanos han denunciado que ya no son solo utilizados para mensajería e inteligencia sino que es alarmante la vinculación directa de los niños como participantes en los enfrentamientos.
Una líder barrial le dijo a la agencia IPC que la comunidad está cansada de denunciar y que las cosas no cambien, que la pobreza y la violencia sigan igual. Su historia se hizo conocer mundialmente en el documental "La Sierra".
Este es uno de los fenómenos más difíciles de entender, pues en esta zona se han hecho inversiones millonarias durante las últimas alcaldías sin que la violencia se reduzca. Por el contrario, se nota un círculo vicioso en que el dominio territorial lo logra alguno de los grupos, hasta que se hace un gran operativo militar y la paz se mantiene un corto tiempo hasta que otro grupo más poderoso llega a pelear de nuevo el poder.
El secretario de gobierno municipal, Juan Felipe Palau, afirmó que el control por parte de las autoridades es total. Pero hace diez días, cinco viviendas de un barrio de la Comuna 13 sufrieron averías durante un enfrentamiento entre dos bandas a plena luz del día. Después de horas de cruce de fuego, 150 hombres del Ejército entraron a la zona y lograron hacer huir a los protagonistas de la balacera.
El alcalde Alonso Salazar se ha quejado incansablemente de la falta de justicia, igual que los representantes de la Policía y el Ejército, que alegan que de las personas a quienes capturan son muy pocos quienes resultan judicializados.
“Medellín ya no aguanta más comisiones, más discursos. Aquí estamos muy solos, necesitamos medidas extraordinarias para la ciudad”, dijo hace unos días el Alcalde quien también pidió la intervención del Gobierno nacional.
Sin embargo, el recuerdo de esas intervenciones no es el mejor. Durante 2002 hubo más de diez intervenciones que culminaron con la Operación Orión, la primera toma del poder de las autoridades en las comunas de Medellín, donde fueron más los desaparecidos y las quejas por violaciones a los Derechos Humanos que los resultados de recuperación del poder de las armas por parte del Estado. Gran parte de esos enfrentamientos se divulgó en el libro de Ricardo Aricapa, “Comuna 13: crónica de una guerra urbana”.
Después de Orión, que intentaba sacar a la guerrilla, se dio vía libre a los paramilitares que dominaron por años esas zonas, hasta la desmovilización, cuando se abrieron en bandas y ahora dejaron por lo menos 12 peleas territoriales.
Febrero 28 de 2002
Se realiza la Operación Contrafuego, acción conjunta de la fuerza pública y organismos de seguridad del Estado. En ésta se realizaron 63 allanamientos, fueron capturadas 31 personas y murieron cinco personas que fueron presentadas por las autoridades como milicianos.
21 de mayo de 2002
Operación Mariscal que tuvo como origen la solicitud impetrada por las autoridades y llevó al allanamiento de 34 viviendas localizadas en la Comuna 13 de la ciudad de Medellín. Esta operación fue dirigida por los generales Mario Montoya Uribe y Leonardo Gallego Castrillón. La Operación Mariscal comenzó a las 3 de la madrugada del señalado 21 de mayo de 2002 y duró aproximadamente 12 horas y media. Murieron nueve civiles, cuatro de ellos menores de edad, hubo 37 heridos y 55 personas más fueron detenidas.
Agosto 4 de 2002
Operación Antorcha, realizada en la madrugada, conjuntamente por la IV Brigada del Ejército, la Policía Metropolitana, la Fuerza Aérea, la Fiscalía y el DAS. En el reporte de esta operación se dio cuenta de 37 personas heridas.
16 de octubre de 2002
Operación Orión. Fuerzas combinadas de Ejército, la Policía, el CTI, la Fuerza Aérea, el DAS y la Fiscalía ingresaron a la comuna 13 para recuperar el territorio tomado por aquel entonces por las milicias del ELN, las Farc y un grupo conocido como Comandos Armados del Pueblo, CAP. Fue ordenada directamente por el ex presidente Álvaro Uribe. Después de los tres días de acciones fueron reportadas las muertes de cuatro militares, diez supuestos milicianos, un civil y fueron detenidas más de 400 personas. Posteriormente, en el proceso de Justicia y Paz varios líderes paramilitares de la zona reconocieron que habían participado de la operación y que muchos de los desaparecidos que fueron reportados estaban enterrados en fosas comunes, en el sector rural de Medellín.
13 de abril de 2009
Se da cuenta de un rebrote de violencia, originado por la “Oficina de Envigado” y que en solo una semana dejó 31 muertos en medio de enfrentamientos. El Presidente Uribe encabeza un consejo extraordinario de seguridad y determina que 500 militares y 6.800 policías deben patrullar permanentemente los barrios más peligrosos. pero para octubre, el Comité Metropolitano de Derechos Humanos de Medellín, integrado por varias organizaciones no gubernamentales de la ciudad, expresaron su preocupación por el incremento que venía registrando el desplazamiento forzado en esta comuna, generado en parte por la presión de los grupos armados a reclutar a niños, niñas y adolescentes.
Agosto 11 de 2010
Un enfrentamiento entre dos bandas se mantuvo por más de tres horas en la Comuna 13. Ciento cincuenta uniformados controlaron la situación.
Para entender o conflito colombiano: guias de um labirinto
http://www.comunidadesegura.org/pt-br/MATERIA-o-conflito-na-colombia?q=es/node/31001
21/11/2006 - 13:53
21/11/2006 - 13:53
Tradução de Shelley de Botton
A Colômbia vive um conflito interno há 40 anos que ainda não foi reconhecido formalmente como guerra civil. Seus habitantes, no entanto, têm sentido as conseqüências deste foco cíclico de violência, que gerou milhões de deslocados, desaparecidos políticos e infâncias robadas em todo o país.
Os atores armados que atuam no conflito são as guerrilhas de esquerda - Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o Exército de Libertação Nacional (ELN) -, as Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC), os narcotraficantes e as Forças Armadas.
As origens do conflito são controvertidas. Alguns autores citam a luta pela terra como motivo principal e outros consideram as disputas políticas da metade do século passado entre os partidos Liberal e Conservador, especialmente durante o período denominado "a violência" (1946-1962), que permitiram o surgimento incipiente das ações de guerrilha.
As Farc e a UP
Segundo o sociólogo Fernando Pizarro, autor de diversos livros e artigos sobre o conflito, o nascimento das guerrilhas rurais das Farc nos anos 60 remonta à criação das "ligas campesinas", que reivindicavam a posse de terra, e que sofriam forte repressão estatal. Mas é na década de 80 que o grupo adota novas estratégias militares e econômicas e transformam sua atuação e dinâmica de expansão.
“Depois de um processo de negociação de paz com o governo, em 1984, quando se desmobilizaram antigos guerrilheiros das Farc e, junto com outros ativistas de esquerda, alguns membros do Partido Comunista e outros ativistas políticos independentes, formaram um movimento que se chamou União Patriótica (UP)”, explica Pablo Emílio Angarita, pesquisador e coordenador do Grupo Interdisciplinar sobre Conflitos e Violências do Instituto de Estudos Regionais da Universidade de Antióquia.
No entanto, a UP não teve uma vida longa. Nas eleições realizadas em meados dos anos 80 chegaram a obter uma votação historicamente alta - quase 10% das prefeituras -, algo muito significativo e que causou escândalo nos setores mais conservadores do país. “Assim começou o extermínio político, o maior genocídio que se tem notícia na história política de Colômbia”, lamenta Pablo.
O pesquisador afirma que cada vez que havia alguma ação guerrilheira, imediatamente eram assassinados dirigentes ou simpatizantes da UP. “Isso acontecia naquela época, e ainda hoje, mesmo a UP tendo acabado, pessoas que foram vinculadas ao movimento no passado continuam sendo assassinadas", acrescenta.
Como resultado são contabilizados mais de quatro mil membros mortos, entre eles homens e mulheres congressistas, prefeitos e prefeitas, governadores e governadoras, deputados e deputadas, e vereadores e vereadoras. “Falando de outra forma, o braço político das Farc foi exterminado, abrindo espaço para a liderança militar e novas fontes de financiamento baseadas na extorção, seqüestro e alianças com os cartéis do narcotráfico, ao mesmo tempo em que foram ofuscadas quaisquer possibilidades de negociação com o governo”, resume Pablo.
Os paramilitares
Fernando Cubides, também sociólogo e autor de livros sobre o conflicto colombiano, relata que os grupos paramilitares, por sua vez, nasceram na década de 80 patrocinados e financiados por propietários de terras, que rapidamente passaram da contenção à ofensiva, atribuindo-se funções próprias do Estado, travando batalhas contra a guerrilha quando assassinavam líderes de esquerda e denominados “amigos da guerrilha”.
Sob um comando único, os paramilitares passam a se chamar Autodefensas Unidas da Colômbia (AUC), se consolidam como uma organização contrainsurgente e começam a incursionar por regiões tradicionalmente dominadas pela guerrilha.
“Nos anos 90 esses grupos cresceram exponencialmente e hoje têm um papel fundamental no conflito interno. As AUC se converteram na organização armada à qual é atribuída a maioria dos massacres que ocorrem no país”, afirma Iván Ramírez, coordenador do Observatório da Infância em Conflito Armado e Violência Armada Organizada e membro do Grupo de Trabalho para o Projeto Coav Cidades em Medellín, Colômbia.
Entre as principais fontes de financiamento destes grupos estão a extorsão, a intimidação, o homicídio, o controle territorial para a exportação de cocaína e o contrabando de armas.
Negociações geram polêmica
Depois de várias tentativas mal-sucedidas de negociações de paz ao longo dos anos, o atual presidente Álvaro Uribe conseguiu firmar um acordo com os grupos paramilitares para que se desmobilizassem sob a polêmica Lei de Justiça e Paz. Cerca de 40 mil combatentes das AUC entregaram suas armas desde que o grupo começou as negociações com o governo em 2003. No entanto, a nova legislação é alvo de inúmeras críticas, tanto por setores da sociedade civil colombianos, como por organizações de defesa dos direitos humanos internacionais.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) adverte que a lei pode “abrir caminho para a impunidade” por ser permissiva demais. De acordo com a lei, os paramilitares que entregarem suas armas, libertarem seqüestrados, se desmobilizarem e cessarem qualquer tipo de hostilidade serão beneficiados com uma forte redução de penas de privação de liberdade. Também amplia a possibilidade de obtenção de liberdade condicional para quem cometeu crimes graves, incluindo crimes contra a humanidade.
Além disso, a lei tem um caráter voluntário e não obriga a declarar a verdade, já que tudo depende da informação que a pessoa queira entregar. “Os paramilitares criaram esta lei. Ela estimula a impunidade, não trata a questão da terra e dá um caráter político a um grupo insurgente, que possibilita sua legalização e facilita a lavagem de dinheiro”, denuncia Iván.
Iván também chama a atenção para a brecha aberta aos narcotraficantes, que podem comprar um exército e tornar-se comandantes para pouco depois se desmobilizarem sob os benefícios da lei, escapando de uma possível extradição aos Estados Unidos.
Além disso, ocorreu uma expansão paramilitar como indica o Informe sobre a Situação dos Direitos Humanos na Colômbia de 2005. Elaborado pela ACNUDH, o documento alerta para uma eventual interferência política desta organização no país. O que foi confirmado por Vicente Castaño – um dos principais chefes paramilitares, que declarou à revista "Semana", em junho de 2005, que as AUC detêm 35% de representatividade no Congresso Nacional.
Segundo um informe da Organización dos Estados Americanos (OEA), divulgado no início de março de 2006, depois de desmobilizados, pelo menos quatro mil paramilitares voltaram a exercer atividades criminosas. O documento explica que diversas frentes paramilitares impediram a desmobilização de grupos clandestinos e começaram a operar com outros nomres.
Luz no fim do túnel?
Não obstante, a Colômbia vive atualmente um momento de distenção. A base da campanha de Uribe para a reeleição em 2006 foi a diminuição dos índices de violência em todo o país. Segundo dados oficiais, a taxa de homicídios caiu 10%, a menor en 18 anos. Entretanto, defensores dos direitos humanos alertam para a necessidade de se revisar as políticas atuais para efetivamente semear a paz na sociedade:
“A negação do direito à reparação, justiça e verdade às vítimas que vêm sofrendo décadas de violência – ao custo da desmobilização dos paramilitares – não servirá senão para aumentar as tensões sociais na Colômbia”, adverte o comunicado Semeando a Futura Violência (Sembrando la Violencia Futura), da Organização Mundial Contra a Tortura (OMCT).
Assim, enquanto as desigualdades socio-econômicas não diminuírem e reais possibilidades de reinserção social aos mais de dois milhões e meio de desabrigados e 14 mil crianças que se estima terem sido recrutadas pelos grupos irregulares forem oferecidas, dificilmente se alcançará uma paz duradoura no país.
Bibliografia:
Cubides, Fernando (1999). “Los Paramilitares y su Estrategias” en Reconocer la
Guerra para Construir la Paz. Bogota, CEREC.
Guerra para Construir la Paz. Bogota, CEREC.
Biografía y obras de Eduardo Pizarro en el sitio de la Universidad Nacional de Colombia:http://www.seminario2005.unal.edu.co/Eduardo%20Pizarro.html
Pizarro Leóngomez, Eduardo (1991). “Las FARC 1949-1966”. Bogotá, Universidad
Nacional de Colombia, Tercer Mundo Editores.
Nacional de Colombia, Tercer Mundo Editores.
Biografía y obras de Fernando Cubides en el sitio de la Universidad Nacional de Colombia:http://www.seminario2005.unal.edu.co/Cubides.html
Ocupação Orion: a UPP de Medellín
Operação Orion: ocupação das favelas da Comuna 13 de Medellín pela polícia e pelo exército para expulsar os grupo guerrilheiros, realizada entre os dias 16 e 20 de outubro de 2002.
Ordenada diretamente pelo Presidente Uribe.
A ocupação foi feita em coordenação com o Bloque Cacique Nutibara (BCN) do grupo Paramilitar Autodefensas Unidas de Colombia (AUC), que passou a atuar na Comuna 13 após a ocupação.
Durante a operação, 4 militares foram mortos, 11 civis foram apresentados como guerrilheiros mortos em combate, 2 pessoas desaparecidas e cerca de 450 foram presas. 38 civis feridos a bala. 1 menor foi executado pelas forças militares, mas a versão oficial é de que foi uma bala perdida.
Nos meses seguintes 68 jovens desapareceram, 355 moradores presos ilegalmente, 170 julgados, a maioria foi absolvida, centenas foram removidos.
O exército "chegou pra ficar" e está lá até hoje.
Essa é a UPP de Medellín, copiada pelo Governo do Rio de Janeiro.
Mas, apesar da presença do exército, ainda há violência armada organizada: grupos formados por ex-paramilitares que disputam o território e o mercado. Têm projeto econômico, têm interesse no Estado, buscam o controle territorial e atacam defensores dos direitos humanos e líderes sociais. Estão ligados ao tráfico de drogas, corrupção, extorsão e intimidação. Usam cada vez mais crianças nas práticas criminosas. Disputam controle sobre escolas.
Ordenada diretamente pelo Presidente Uribe.
A ocupação foi feita em coordenação com o Bloque Cacique Nutibara (BCN) do grupo Paramilitar Autodefensas Unidas de Colombia (AUC), que passou a atuar na Comuna 13 após a ocupação.
Durante a operação, 4 militares foram mortos, 11 civis foram apresentados como guerrilheiros mortos em combate, 2 pessoas desaparecidas e cerca de 450 foram presas. 38 civis feridos a bala. 1 menor foi executado pelas forças militares, mas a versão oficial é de que foi uma bala perdida.
Nos meses seguintes 68 jovens desapareceram, 355 moradores presos ilegalmente, 170 julgados, a maioria foi absolvida, centenas foram removidos.
O exército "chegou pra ficar" e está lá até hoje.
Essa é a UPP de Medellín, copiada pelo Governo do Rio de Janeiro.
Mas, apesar da presença do exército, ainda há violência armada organizada: grupos formados por ex-paramilitares que disputam o território e o mercado. Têm projeto econômico, têm interesse no Estado, buscam o controle territorial e atacam defensores dos direitos humanos e líderes sociais. Estão ligados ao tráfico de drogas, corrupção, extorsão e intimidação. Usam cada vez mais crianças nas práticas criminosas. Disputam controle sobre escolas.
Trabalho do AfroReggae sobre o Conflito Colombiano
Trechos do Documentário "O Veneno e o Antídoto: uma visão da violência na Colômbia", feito pelo Grupo Cultural AfroReggae e Pindorama Filmes:
O pessoal que aparece no minuto 1:42 é do Grupo SonBatá, da Comuna 13, com o qual vamos trabalhar.
Aqui um pequeno trecho do episódio do Programa Conexões Urbanas, da Multishow, sobre o modelo de segurança de Medellín:
http://multishow.globo.com/Conexoes-Urbanas/Episodios/Medellin.shtml
O pessoal que aparece no minuto 1:42 é do Grupo SonBatá, da Comuna 13, com o qual vamos trabalhar.
Aqui um pequeno trecho do episódio do Programa Conexões Urbanas, da Multishow, sobre o modelo de segurança de Medellín:
http://multishow.globo.com/Conexoes-Urbanas/Episodios/Medellin.shtml
Frente 3 de Fevereiro em Medellín, Colômbia
A partir do convite para participar do Encontro MDE11, no Museo de Antioquia, em Medellín, Colômbia, fizemos a seguinte proposta de trabalho:
El proyecto se propone establecer un espacio de intercambio, reflexión y experiencia acerca del pasado y del futuro de las sociedades Latinoamericanas. Este espacio será constuído a partir de la conexión virtual entre experiencias de ocupación militar o policial de favelas en Haiti, Medellín y Rio de Janeiro; la constitución de ciudades espetáculo; la exclusión social y racial de nuestro pasado y presente.
La historia empieza en Haiti, en la única revolución hecha por esclavos, el primer país a tornarse independiente en America Latina. Sin embargo, la imposición de deudas y de contról militar por parte de Francia y Estados Unidos hicieron con que Haiti se convirtiera en uno de los países más pobres del mundo. En el presente, el país está ocupado por fuerzas militares de la ONU, lideradas por el ejército de Brasil, que desarollaron en la instituicion de la policia militar una metodología de actuación en grandes favelas urbanas.
Rio de Janeiro fué la mayor ciudad negra del mundo, fuera de África, en el siglo XIX. En las grandes favelas que se desarollaron en el siglo XX, el narcotrafico dió origen a una idea de guerra que domina la forma de actuación de la policia en esos espacios. Hoy, una nueva política de seguridad, las Unidades de Policia Pacificadora (UPP), utiliza la experiencia de grupos de elite de la policia en el combate en las favelas para ocupar permanentemente favelas antes controladas por el trafico. La experiencia del ejército en Haiti contribuyó para la creación de un espetaculo mediatico que fué la ocupación de la mayor fortaleza del trafico en la ciudad en el año pasado, tres años antes del Mundial de Fútbol.
El origen de esta nueva política viene de las ocupaciones militares de las favelas en Medellín, con los Proyectos Urbanos Integrales (PUI). Esto en un país de America Latina con una fuerte herencia de la esclavitud negra.
Cómo se articulan estos procesos de nuestro pasado y presente?
Qué posibilidades nos presentan para el futuro?
Qué procesos de exclusión y de liberación se conforman en estas experiencias?
Para reflexionar acerca de esos temas, nuestro proyecto se propone a conocer mejor la experiencia de Medellín, a partir de entrevistas con activistas y lideres comunitarios; intercambios con grupos artísticos y políticos; y charlas con personas que viven en las comunas de Medellín que fueron ocupadas por la policía.
En especial, estaremos en permanente interacción con el grupo Son Bata, de la Comuna 13.
De esas interacciones, vamos a invitar a los grupos y personas que conocimos para una conversación publica para discutir las cuestiones que van a surgir en el proyecto. En esa conversación, vamos a discutir y proponer intervenciones urbanas en el espacio público llamando a una reflexión acerca de esos temas.
Hechas la investigación y las intervenciones, vamos a producir materiales de video, música y artes graficas, que se presentarán al final del proyecto.
La posibilidad de crear una interacción entre las diversas artes contribuye para crear diferentes posibilidades de reflexión acerca de los temas.
Chegamos em Medellín dia 20 de Outubro e colocaremos contantemente os frutos da pesquisa e do trabalho realidos por aqui.
El proyecto se propone establecer un espacio de intercambio, reflexión y experiencia acerca del pasado y del futuro de las sociedades Latinoamericanas. Este espacio será constuído a partir de la conexión virtual entre experiencias de ocupación militar o policial de favelas en Haiti, Medellín y Rio de Janeiro; la constitución de ciudades espetáculo; la exclusión social y racial de nuestro pasado y presente.
La historia empieza en Haiti, en la única revolución hecha por esclavos, el primer país a tornarse independiente en America Latina. Sin embargo, la imposición de deudas y de contról militar por parte de Francia y Estados Unidos hicieron con que Haiti se convirtiera en uno de los países más pobres del mundo. En el presente, el país está ocupado por fuerzas militares de la ONU, lideradas por el ejército de Brasil, que desarollaron en la instituicion de la policia militar una metodología de actuación en grandes favelas urbanas.
Rio de Janeiro fué la mayor ciudad negra del mundo, fuera de África, en el siglo XIX. En las grandes favelas que se desarollaron en el siglo XX, el narcotrafico dió origen a una idea de guerra que domina la forma de actuación de la policia en esos espacios. Hoy, una nueva política de seguridad, las Unidades de Policia Pacificadora (UPP), utiliza la experiencia de grupos de elite de la policia en el combate en las favelas para ocupar permanentemente favelas antes controladas por el trafico. La experiencia del ejército en Haiti contribuyó para la creación de un espetaculo mediatico que fué la ocupación de la mayor fortaleza del trafico en la ciudad en el año pasado, tres años antes del Mundial de Fútbol.
El origen de esta nueva política viene de las ocupaciones militares de las favelas en Medellín, con los Proyectos Urbanos Integrales (PUI). Esto en un país de America Latina con una fuerte herencia de la esclavitud negra.
Cómo se articulan estos procesos de nuestro pasado y presente?
Qué posibilidades nos presentan para el futuro?
Qué procesos de exclusión y de liberación se conforman en estas experiencias?
Para reflexionar acerca de esos temas, nuestro proyecto se propone a conocer mejor la experiencia de Medellín, a partir de entrevistas con activistas y lideres comunitarios; intercambios con grupos artísticos y políticos; y charlas con personas que viven en las comunas de Medellín que fueron ocupadas por la policía.
En especial, estaremos en permanente interacción con el grupo Son Bata, de la Comuna 13.
De esas interacciones, vamos a invitar a los grupos y personas que conocimos para una conversación publica para discutir las cuestiones que van a surgir en el proyecto. En esa conversación, vamos a discutir y proponer intervenciones urbanas en el espacio público llamando a una reflexión acerca de esos temas.
Hechas la investigación y las intervenciones, vamos a producir materiales de video, música y artes graficas, que se presentarán al final del proyecto.
La posibilidad de crear una interacción entre las diversas artes contribuye para crear diferentes posibilidades de reflexión acerca de los temas.
Chegamos em Medellín dia 20 de Outubro e colocaremos contantemente os frutos da pesquisa e do trabalho realidos por aqui.
segunda-feira, 19 de abril de 2010
O aqui também é lá
por Marisa Flórido Cesar
Desenhar à asfixia o horizonte, ordenar ao desatino o espaço da vida. De tal modo que, ao fim desse projeto, era a própria humanidade que se construiria como obra. Uma humanidade de semelhantes, substancial, todavia ilusória. Esse foi o projeto da História e o ideal moderno da arquitetura, do qual o edifício de Affonso Eduardo Reidy tornou-se um ícone: se o tempo se desenrolava em direção a um horizonte comum, o espaço deveria ser a extensão redentora, o receptáculo que a todos resguardaria. Ao homem redimido seria prometido o acesso absoluto, o abrigo universal. Babel antes da queda e da dispersão das línguas, Babel reconstruída. Uma promessa a um só tempo acolhedora e autoritária. Tensão perpétua entre o desejo de interferência e mudança e os delírios de ordem e controle sobre os acidentes e as singularidades.
Sem lugar e ocasião para a alteridade, para os desvios e as fugas, as utopias históricas — do marxismo aos fascismos (a face obscura e violenta desse desejo de totalidade) — ruíram ali mesmo onde se ergueram. E se testemunhamos, hoje, o esgotamento dessa promessa, também assistimos ao fracasso do projeto da cidade do Homem. O mundo único, idêntico e comum revela-se espectral; a humanidade, fantasmáticai.
Desde logo, o coletivo Frente 3 de Fevereiro definiu sua pretensão. Não o edifício, a fita ondulante sobre pilotisii, ou as táticas do habitat. Nem intervir artisticamente em sua materialidade, nem nas dinâmicas sociais dos que ali hoje vivem, mas enfrentar aquilo que o projeto moderno nos deixou como legado em suas faces assombrosas e assombradas. Se a arquitetura moderna se pretendia acolhedora, seria preciso enfrentar o que foi expurgado de seu ideal, enfrentar a cidade como a arena dos conflitos e da convivência de complexas diferenças. Pensar a cidade por seus guetos e exclusões, mas também a partir – e além – do ícone moderno (o edifício transformado em imagem veiculada em livros e sites sobre arquitetura), pensar a própria cidade como extrema exposição, exibindo-se como imagem e espetáculo. Afinal, este é um mundo que se produz sob a lógica imanente do capital, na velocidade da informação, na disputa do monopólio das visibilidades (ou, como preconizaria Guy Debord, o capital atingiria tal grau de acumulação que se tornaria imagem, invadindo e mediando a vida socialiii). As cidades, outrora espaço por excelência da vida em comum, relacionam-se doravante em rede. Âncoras dos fluxos desterritorializados de capital e informação, competem para atraí-los e concentrá-los: competem por um museu ou para sediar grandes eventos como as olimpíadas. A própria cidade, tornando-se um grande evento, retira-se para essa dimensão espetacular: a cidade da era turística é aquela que se exibe e existe como se separada de si. E, no entanto, enquanto as cidades tornam-se protagonistas da sociedade do espetáculo, os conceitos de civilidade e cidadania, a ela intimamente relacionados, debatem-se extenuados em suas fronteiras e em suas guerras intestinas. Se no tempo e espaço encerravam-se as grandes esperanças de transformação do passado, é a imagem que agora explicita seus poderes (um poder que, de fato, remonta a milênios).
Se o mundo se experimenta em rede, na simultaneidade das ocasiões, na atopia e distopia do espaço, nas guerras por territórios, as relações de força e os dispositivos de poder também operam em rede, incidindo sobre as formas de vida de modo muito mais sutil e interiorizado — conformando-as, incidem sobre o desejo e a linguagem, os corpos e a percepção, as relações e os saberes, as subjetividades e as ações... Uma dominação, mais disseminada e invisível que as colonizações do passado e as ideologias modernas, se instaura: uma sociedade sob a vigilância “de técnicas de controle e comunicação instantânea”iv, definiria Deleuze; uma sociedade espetacularizada, anteveria Debord.
A essa humanidade fantasmática, a essa espetacularização da vida, a essa comercialização do visível, as artes responderiam de modo diverso e paradoxal, em relações de resistência e inelutável conivência. E não apenas porque a arte alimenta o marketing cultural (e dele também se sustenta), conferindo visibilidade a empresas ou governos, ou porque é convocada a alavancar reformas urbanas em áreas degradadas. Mas porque todos os poderes (como o capital, a imagem, a mídia) não são exteriores, moldam a vida e as subjetividades, investem sobre aquilo que nomeamos “arte” de modo intrínseco, inseparável, avassalador. A resistência da arte é, portanto, também uma resistência a si mesma e uma resistência ao que somos. Eis seu impasse e seu desafiov.
O Rio de Janeiro não permaneceria insensível ao redesenho das forças. Nestas últimas décadas, se empenharia em atrair um grande museu internacional, concorreria para sediar grandes eventos esportivos, como as Olimpíadas de 2016. Enquanto isso, a cidade dilacerava-se em suas guerras viscerais, em suas tragédias cotidianas e seus assassinatos desatentos. A cidade-narciso cintilava seu charme enquanto a cidade-medusa a fitava com os olhos da morte.
Por isso o foco do coletivo convergiria para as fronteiras internas da cidade; para a falácia por trás dos discursos de convivência pacífica das diferenças; para os símbolos manipulados e espetacularizados destes apaziguamentos e alegrias coletivas, como o carnaval e a praia. Sua atenção se voltaria, finalmente, para a inserção estratégica nas mídias como a televisão, para a intervenção na cidade-imagem.
O grupo partiria para a primeira favela que recebeu a Unidade de Polícia Pacificadora, a de Santa Marta. Entre os encantos e misérias que a assolam, investiriam contra o disparate que contradiz a proclamada concretização de um espaço vital comum e de um pacto social: o muro que cerca a favela e pretende conter sua expansão. Sobre ele, os artistas lutariam capoeira, como equilibristas das novas senzalas. Nele, pintariam um grande buraco como se o vazassem, ou então empinariam pipas. A arte sonha um mundo em que pipas fossem capazes de levar ao vento muros e apartheids. A arte imagina humanidades, além daquela vislumbrada pelo Humanismo ocidental. Humanidades por vir, fluidas, abertas, imprevisíveis. Humanidades do homem qualquer, no sentido que Agamben recuperou desse qualquer: do latim quodlibet, “qualquer que seja, o que se quiser, o que desejar”. O qualquer estabelece uma relação com o desejo e a vontade (libet): quodlibet ens é o ser que, tal como é, importa, é desejável em todos os seus atributos. Não é, portanto, o ser que “não importa qual, que nos é indiferente”, como em geral é traduzido. Nem identidade, nem conceito, o que determina a singularidade é a totalidade das possibilidades: o “tudo importar” do qualquer, não sua indiferençavi.
Quando, no carnaval carioca, eles invadem a Marques de Sapucaí com uma câmera e um microfone em mãos perguntando “o Rio continua negro?”, a ambivalência da palavra geraria incômodo aos entrevistados. A dubiedade de sentidos visava explicitar as discriminações raciais, a nefasta violência disseminada por séculos nestas terras, a espetacularização de uma festa e de uma música que se iniciou pelas margens. Mas enunciar “o Rio é negro” ou “nós somos negros” é sobretudo um ato de simbolização: entre uma subjetivação e sua predicação há um desvio, jamais uma coincidência ou mesmo uma identificação. Há, como diria Rancière, o salto da metáfora.
E se essa dissonância na cadência do samba-midiático pretende reivindicar lugares e ritmos diferentes daqueles que eram demarcados às existências, novas alegrias e outras vozes, também poderíamos dizer que tais lugares e tais ritmos querem estar em qualquer parte e em qualquer acorde do orbe. Um mundo, uma esfera azul flutuando nas mãos de uma multidão em delírio. Nela, a inscrição: “Haiti” e “aqui”. A esfera rodopiou sobre as cabeças, girou em órbita carnavalesca, quicou aqui e acolá no frenesi coletivo do bloco carioca, acabou espancada e combalida sob os pés de alguns.
O Haiti é aqui e aqui é lá, um aqui lá qualquer. O lugar que se quiser, que se desejar. Um qualquer desejante que não apenas se situe além de um espaço determinado, mas que seja a passagem, o acesso e a comissão de frente anunciando a cidade humana. Uma cidade que se abra à alteridade qualquer: do passista fenomenal ao ruim da cabeça e ao doente do pé.
Desenhar à asfixia o horizonte, ordenar ao desatino o espaço da vida. De tal modo que, ao fim desse projeto, era a própria humanidade que se construiria como obra. Uma humanidade de semelhantes, substancial, todavia ilusória. Esse foi o projeto da História e o ideal moderno da arquitetura, do qual o edifício de Affonso Eduardo Reidy tornou-se um ícone: se o tempo se desenrolava em direção a um horizonte comum, o espaço deveria ser a extensão redentora, o receptáculo que a todos resguardaria. Ao homem redimido seria prometido o acesso absoluto, o abrigo universal. Babel antes da queda e da dispersão das línguas, Babel reconstruída. Uma promessa a um só tempo acolhedora e autoritária. Tensão perpétua entre o desejo de interferência e mudança e os delírios de ordem e controle sobre os acidentes e as singularidades.
Sem lugar e ocasião para a alteridade, para os desvios e as fugas, as utopias históricas — do marxismo aos fascismos (a face obscura e violenta desse desejo de totalidade) — ruíram ali mesmo onde se ergueram. E se testemunhamos, hoje, o esgotamento dessa promessa, também assistimos ao fracasso do projeto da cidade do Homem. O mundo único, idêntico e comum revela-se espectral; a humanidade, fantasmáticai.
Desde logo, o coletivo Frente 3 de Fevereiro definiu sua pretensão. Não o edifício, a fita ondulante sobre pilotisii, ou as táticas do habitat. Nem intervir artisticamente em sua materialidade, nem nas dinâmicas sociais dos que ali hoje vivem, mas enfrentar aquilo que o projeto moderno nos deixou como legado em suas faces assombrosas e assombradas. Se a arquitetura moderna se pretendia acolhedora, seria preciso enfrentar o que foi expurgado de seu ideal, enfrentar a cidade como a arena dos conflitos e da convivência de complexas diferenças. Pensar a cidade por seus guetos e exclusões, mas também a partir – e além – do ícone moderno (o edifício transformado em imagem veiculada em livros e sites sobre arquitetura), pensar a própria cidade como extrema exposição, exibindo-se como imagem e espetáculo. Afinal, este é um mundo que se produz sob a lógica imanente do capital, na velocidade da informação, na disputa do monopólio das visibilidades (ou, como preconizaria Guy Debord, o capital atingiria tal grau de acumulação que se tornaria imagem, invadindo e mediando a vida socialiii). As cidades, outrora espaço por excelência da vida em comum, relacionam-se doravante em rede. Âncoras dos fluxos desterritorializados de capital e informação, competem para atraí-los e concentrá-los: competem por um museu ou para sediar grandes eventos como as olimpíadas. A própria cidade, tornando-se um grande evento, retira-se para essa dimensão espetacular: a cidade da era turística é aquela que se exibe e existe como se separada de si. E, no entanto, enquanto as cidades tornam-se protagonistas da sociedade do espetáculo, os conceitos de civilidade e cidadania, a ela intimamente relacionados, debatem-se extenuados em suas fronteiras e em suas guerras intestinas. Se no tempo e espaço encerravam-se as grandes esperanças de transformação do passado, é a imagem que agora explicita seus poderes (um poder que, de fato, remonta a milênios).
Se o mundo se experimenta em rede, na simultaneidade das ocasiões, na atopia e distopia do espaço, nas guerras por territórios, as relações de força e os dispositivos de poder também operam em rede, incidindo sobre as formas de vida de modo muito mais sutil e interiorizado — conformando-as, incidem sobre o desejo e a linguagem, os corpos e a percepção, as relações e os saberes, as subjetividades e as ações... Uma dominação, mais disseminada e invisível que as colonizações do passado e as ideologias modernas, se instaura: uma sociedade sob a vigilância “de técnicas de controle e comunicação instantânea”iv, definiria Deleuze; uma sociedade espetacularizada, anteveria Debord.
A essa humanidade fantasmática, a essa espetacularização da vida, a essa comercialização do visível, as artes responderiam de modo diverso e paradoxal, em relações de resistência e inelutável conivência. E não apenas porque a arte alimenta o marketing cultural (e dele também se sustenta), conferindo visibilidade a empresas ou governos, ou porque é convocada a alavancar reformas urbanas em áreas degradadas. Mas porque todos os poderes (como o capital, a imagem, a mídia) não são exteriores, moldam a vida e as subjetividades, investem sobre aquilo que nomeamos “arte” de modo intrínseco, inseparável, avassalador. A resistência da arte é, portanto, também uma resistência a si mesma e uma resistência ao que somos. Eis seu impasse e seu desafiov.
O Rio de Janeiro não permaneceria insensível ao redesenho das forças. Nestas últimas décadas, se empenharia em atrair um grande museu internacional, concorreria para sediar grandes eventos esportivos, como as Olimpíadas de 2016. Enquanto isso, a cidade dilacerava-se em suas guerras viscerais, em suas tragédias cotidianas e seus assassinatos desatentos. A cidade-narciso cintilava seu charme enquanto a cidade-medusa a fitava com os olhos da morte.
Por isso o foco do coletivo convergiria para as fronteiras internas da cidade; para a falácia por trás dos discursos de convivência pacífica das diferenças; para os símbolos manipulados e espetacularizados destes apaziguamentos e alegrias coletivas, como o carnaval e a praia. Sua atenção se voltaria, finalmente, para a inserção estratégica nas mídias como a televisão, para a intervenção na cidade-imagem.
O grupo partiria para a primeira favela que recebeu a Unidade de Polícia Pacificadora, a de Santa Marta. Entre os encantos e misérias que a assolam, investiriam contra o disparate que contradiz a proclamada concretização de um espaço vital comum e de um pacto social: o muro que cerca a favela e pretende conter sua expansão. Sobre ele, os artistas lutariam capoeira, como equilibristas das novas senzalas. Nele, pintariam um grande buraco como se o vazassem, ou então empinariam pipas. A arte sonha um mundo em que pipas fossem capazes de levar ao vento muros e apartheids. A arte imagina humanidades, além daquela vislumbrada pelo Humanismo ocidental. Humanidades por vir, fluidas, abertas, imprevisíveis. Humanidades do homem qualquer, no sentido que Agamben recuperou desse qualquer: do latim quodlibet, “qualquer que seja, o que se quiser, o que desejar”. O qualquer estabelece uma relação com o desejo e a vontade (libet): quodlibet ens é o ser que, tal como é, importa, é desejável em todos os seus atributos. Não é, portanto, o ser que “não importa qual, que nos é indiferente”, como em geral é traduzido. Nem identidade, nem conceito, o que determina a singularidade é a totalidade das possibilidades: o “tudo importar” do qualquer, não sua indiferençavi.
Quando, no carnaval carioca, eles invadem a Marques de Sapucaí com uma câmera e um microfone em mãos perguntando “o Rio continua negro?”, a ambivalência da palavra geraria incômodo aos entrevistados. A dubiedade de sentidos visava explicitar as discriminações raciais, a nefasta violência disseminada por séculos nestas terras, a espetacularização de uma festa e de uma música que se iniciou pelas margens. Mas enunciar “o Rio é negro” ou “nós somos negros” é sobretudo um ato de simbolização: entre uma subjetivação e sua predicação há um desvio, jamais uma coincidência ou mesmo uma identificação. Há, como diria Rancière, o salto da metáfora.
E se essa dissonância na cadência do samba-midiático pretende reivindicar lugares e ritmos diferentes daqueles que eram demarcados às existências, novas alegrias e outras vozes, também poderíamos dizer que tais lugares e tais ritmos querem estar em qualquer parte e em qualquer acorde do orbe. Um mundo, uma esfera azul flutuando nas mãos de uma multidão em delírio. Nela, a inscrição: “Haiti” e “aqui”. A esfera rodopiou sobre as cabeças, girou em órbita carnavalesca, quicou aqui e acolá no frenesi coletivo do bloco carioca, acabou espancada e combalida sob os pés de alguns.
O Haiti é aqui e aqui é lá, um aqui lá qualquer. O lugar que se quiser, que se desejar. Um qualquer desejante que não apenas se situe além de um espaço determinado, mas que seja a passagem, o acesso e a comissão de frente anunciando a cidade humana. Uma cidade que se abra à alteridade qualquer: do passista fenomenal ao ruim da cabeça e ao doente do pé.
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